Fechando ciclos

Esse ano

eu queria terminar 

grata

Não queria pensar

no que falta

Nem nutrir esperança

com desejos vencidos

Interlocução

O menino que aprendeu

a ser dois

Quis ser quem era antes

quando voltou a ser um

Travessias

Assisti sua poesia
E meu coração pulou
Quando você chamou
Pelo meu nome
Eu tremi

Sonsos

Eu abri o meu peito

Dividi a identidade

íntima do meu ser

E o que era riso

Virou

S i l ê n c i o

Inconsistência

Eu que não me ocupava

Recolhia meus trapos

Amarrava-os sob os ombros

E andava

In-diferentes

O que é isso aí que tu tem?

Isso aí que te rouba a voz

Te faz pesar o peito

Que te isola

Me tira a paz

Meu-bem-querer

A gente se têm

Numa dimensão mística

Onde o silêncio

Se explica

Onde nosso olhar 

Converge

Meu sonho menino

Menino sonho

Qual a cor da sua asa?

Qual o peso da sua alma?

O teu fardo dói?

Na corda bamba

O sufoco das ideias me toma muito facilmente. Era sopro de esperança e luz, agora é densidade e angústia fora de hora. Eu tenho esse hábito de sofrer por antecipação. Antevejo minha queda, antes mesmo do impulso ser desenhado.

Dupla

Um ser dual que crê

Que a unidade

Tem mais de uma face

Flecha entre rios

Eu sou lágrima pura

A vida me emociona

A dor me transborda

A alegria enche meus olhos d’água

Borboleta-corpo

Eu passei anos

Trancada

Num casulo involutivo

Bolha

O verde das matas

Fez-se laranja fogo

O pulmão do mundo

Incinerou

Hábitos

Construí sua versão

Pra mim

Fundei você

No meu coração

Raiva

Mande aviõezinhos

Pra mim

Com seus versos

Tirados

Do fundo da alma

Saudade

Lembre-se de mim

Agora

Que estamos distantes

Se quando eu estava 

Ao seu alcance

Você preferia sangrar

Só

Conformismo

Tenho um punhado de sentimentos

Que gritam aqui dentro

Alimentam minha insônia

Te tatuam na minha alma

Te guardam

Na eternidade do sentir

Meu chão

Você tá escapando

Entre meus dedos

Gotejando

Por toda parte

Inundando 

a minha casa.

Etérea

Matéria fugaz

Quer sempre mais

Planeja

Sonha

Arquiteta

Silêncios vãos

Estou aqui pelos ruídos

Do teu corpo

Rastreio

Teu cheiro

E memorizo

Suas particularidades.

Toca-me ou troca-me

Toca-me agora

Dedilha-me como um piano

Me tenha

Escondida

Distante de todos.

Escura

No maniqueísmo 

de sentimentos

Que se confundem

com corpos ideais

O Sol é loiro

O mar tem íris azuis

Chaos

Atos desumanos me dão vertigem.

Há de se dizer 

Que me perco 

Com a parte humana 

Que vejo

Descer pelo ralo.

Enfermos

O que é são?

Entrar na competição?

Participar da paródia que é

Permitir todo santo dia

Ser fantoche

Ou ser pisado

Por estranhos arrogantes

Que ocupam cargos

Aparentemente mais importantes

Que você

Adulta

Queria agora 

a pureza das crianças. 

Que acreditam 

que tudo há de vingar. 

Não sabem de consequências

ou responsabilidades. 

Não tem tantas cicatrizes

que a façam recuar.

Caminhos

Estou furiosa pelo incontrolável prazer de sentir. Não adianta reler, talvez nunca faça sentido. Os amantes têm um outro código. É mistério o trânsito das sensações. Nunca passa. Nunca é igual. Vai da euforia à dor. A minha certeza por vezes fica sem chão. Minha vaidade grita. Meus defeitos tão humanos se alternam.

Além-mar

Eu sou onda

eu me adapto

Me coloco

nos espaços

Eu transbordo

em violência

Eu escorro 

em elegância

Eu te nutro!

Palpitações musicais

Tipo uma energia sufocante

Aquece e me paralisa

Deixo de sentir meu pulsar

Sororidade

A maioria feminina

quer caber no ínfimo espaço 

que o patriarcado permite. 

Drogando-se

O amor é a minha droga

E por ser viciada anseio

Em sempre senti-lo.

Todo viciado sente-se

Meio errado ao dar vazão

A seu vício.

Um galho

Ás vezes penso que sou milagre, porque me estico desse tronco garboso. Outras, sinto um medo enorme! Daqui do alto posso ver o chão e sei que se eu secar, eu caio. Eu caio de forma insignificante, como um graveto estorricado.

Eu escrevo a minha história

Olha você aqui de novo.
Tipo cometa,
Acendendo meu peito em chamas
Fazendo meu astigmatismo gritar
Com a visão

Eu fui... afeto!

Que incrível que eu era
admirada por você
Sentada na cadeira que você comprou
Ouvindo seus versos de amor

Fora de hora

Andei errando as batidas. Não faz muito tempo que exagerei na dose. Coloquei brilho demais em alguns rastros que cruzei. Daí desacelerei, retomei meus planos e caí em outra rota. Sentei um pouco, examinei de longe, fui dar uma volta...

Engolida

Numa mão tenho os meus sonhos, no outro a praticidade. No dia a dia, é como se eu lançasse uma bola de uma mão para outra, porque mesmo quando estou criando estratégias, estou mirando em ideais. Mas você sabe, a vida não é simples!

Egoísta

Todo dia me convenço 

que devo trocar comigo mesma 

meus segredos. 

O peso da verdade

A era é plástica. A notícia é fake. Você diz que quer sinceridade, mas não aguenta a verdade quando se bate de frente com ela. O mundo é veloz e as facilidades muitas. Assim, todos querem conveniência.

Eu sou

Tenho preguiça de me esticar nas fotos pra que meu corpo fique perfeito. Minhas roupas são a mistura de vários estilos e não cedo pra maioria dos vícios modernos. Então, não meu bem, não terei lisergias com você. Meus olhos estão sempre bem abertos.

Líquida e funda

Eu mergulhei e me encolhi no fundo do meu oceano. Longe de todo esse barulho etéreo e terrestre. Onde o burburinho é distante e eu posso estar apenas comigo. Aqui, minhas lágrimas salgadas estão em casa e não me envergonham.

Fragmentada

Existem pedaços de mim por toda parte. Todos que visitaram meu coração me repartiram e assim, levaram consigo um pouco do que me mantém de pé.

Metade

Todo mundo que fala de amor discute

se é metade

ou complemento,

de certeza

só sabemos

é que transborda. 

Toque

Eu imaginei mil outros corpos fazendo o que você fez. Eu desejei mil outras pessoas me causando arrepio e até vi em alguns filmes as táticas que você usou. Por isso eu não me contive e ri. Eu ri descaradamente da sua obviedade, mas nem por isso odiei. Eu fiquei surpresa pelas sensações e meio irritada comigo mesma por estar caindo nesses truques.

Paranoia

Eu estava fazendo círculos no joelho com a ponta do dedo indicador, ouvindo um folk sobre questões mal resolvidas, deixando a ansiedade tomar conta de mim. Eu estava convicta de que mais uma vez caí na armadilha de querer o que não pode ser meu. Você estava tão ao meu alcance que não podia ser real. Eu juntei as peças que pipocaram na minha lembrança e eu sabia: me deixei levar. Você não estava tão perto quanto eu imaginava.

Chuva

Gosto quando o Sol abaixa pra dar espaço às nuvens carregadas. É como se o tempo estivesse me preparando pra chuva. Nessas horas, meu coração esquenta e eu fico até eufórica, querendo aninhar-me em um canto a fim de assistir a chuva cair.

Porta entreaberta

Eu te disse adeus, mas só esperei você sair pra ficar na porta te vendo sumir no horizonte. Hoje eu até ando pela casa, sento-me na mesa, dou conta da vida. Mas ao fim de toda atividade, encaro a mesma porta, esperando você voltar.

Machucado

Sim, você é. E por essência: masculino. Sinto que você nega sua verdade pelo padrão do que deveria ser. Pela virilidade que deveria aparentar. Você se tranca por medo ou por comodidade?

Sobre a maternidade

Hoje percebo que tenho uma relação complicada com a maternidade. Sempre tive vontade de ter filhos, gosto de observar crianças, mas ainda fico um tanto confusa no quesito prático de lidar com elas. Para além disso, toda a mobilização que envolve bebês me intriga.

Idealizo-te

Estou saudosa de você. Hoje li sobre essas saudades, assim só tive a certeza que jamais te esqueceria. E que arrancar-te, então, era um sofrimento vão. Devo focar no amanhã, ainda que eu lembre de nós.

Labirinto do amor

Caí em mim: esse tempo todo criei subterfúgios pra me sentir desejada. Mas certos desejos não são saudáveis. Subterfúgios viram padrões, que viram doença e deixam a gente acomodado com falsos sentimentos.

Eu, Minotauro.

Eu que sempre engavetei minhas vontades e sensações, resolvi abrir todas as gavetas ao mesmo tempo. Peguei o caminho inverso do meu comodismo. Gritei que tinha medo, mas mesmo assim fui!

Vazante

Quando pequena, eu chorava muito. Tanto que senti que minhas lágrimas me prejudicavam. Você sabe, as pessoas sempre procuram motivos pra apontar. Então parei. Chorei sozinha no meu quarto, quando precisei. Pros outros, nunca mais.